O Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma boa decisão nesta quarta-feira ao definir que a Lei da Ficha Limpa só poderá ser aplicada nas eleições de 2012. Embora salutar, a definição veio um pouco tarde. Última instância do Judiciário brasileiro, o Supremo poderia ter eliminado uma gigantesca dose de incerteza jurídica lá atrás, antes das eleições de 2010, caso tivesse chegado logo a essa conclusão.
A Lei Complementar 135 barra a candidatura de políticos condenados por órgãos colegiados (em que há mais de um juiz) e que renunciaram para escapar da punição, entre outros critérios.
A aplicação da nova lei - inflada por forte apelo social - somente no próximo pleito pode parecer um triunfo da corrupção à primeira vista, já que trará de volta ao tabuleiro políticos com ficha corrida. Não é. Não se pode mudar, no meio do caminho, as regras do jogo eleitoral. Isso é típico de regimes autoritários. O que está em jogo é a segurança jurídica, um dos pilares da democracia. E ela foi foi preservada pela decisão.
"A iniciativa popular [ou seja, a Lei da Ficha Limpa] é mais do que salutar, desde que em consonância com as garantias constitucionais", resumiu Luiz Fux, o fiel da balança. Em seu primeiro julgamento de repercussão, o novato estreou bem.
Processo eleitoral - O ministro aliou-se à corrente vencedora, puxada pelo ex-presidente Gilmar Mendes. Essa corrente levou em conta os princípios da anualidade e da anterioridade. Traduzindo o jargão jurídico: o princípio da anualidade diz que uma lei que alterar o processo eleitoral não poderá ser aplicada à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência e o princípio da anterioridade diz que a medida em questão não pode ser aplicada a políticos condenados antes da promulgação da própria lei.
A Lei da Ficha Limpa foi sancionada em junho de 2010. Diz o artigo 16 da Constituição brasileira. "A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência".
O TSE havia entendido que a Ficha Limpa não alterava o processo eleitoral, por isso a aplicou em 2010. Fux foi na linha contrária. "Ela representa uma alteração profunda no processo eleitoral", justificou o ministro. "As vozes que pedem a validade imediata da lei não encontram respaldo no ordenamento jurídico." Ao proclamar o resultado da votação, o presidente do Supremo, Cezar Peluso, fez críticas à aplicação retroativa da lei. "É uma circunstância histórica que nem as ditaduras ousaram fazer", disse, defendendo que a inelegibilidade é uma sanção grave, já que o candidato é banido da vida pública.
Empates - Foi preciso analisar três vezes os critérios da nova lei para que o STF finalmente batesse o martelo. Após vergonhoso empate na primeira vez em que se debruçou sobre a questão, em setembro de 2010, ao julgar recurso do então candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC), a corte voltou ao tema um mês depois.
Daquela vez, ao analisar recurso de Jader Barbalho (PMDB), candidato ao Senado pelo Pará, recorreu ao regimento interno para escapar do vexame de um novo racha. Seguiu a sugestão do ministro mais experiente, o decano Celso de Mello. Diante da cadeira vazia do aposentado Eros Grau e do plenário incompleto, com apenas 10 lugares ocupados, o Supremo resolveu manter decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e barrou Barbalho.
Somente nesta quarta, seis meses depois do primeiro julgamento, o nó jurídico foi desatado. O desfecho ocorreu na análise de recurso apresentado pelo ex-deputado estadual Leonídio Bouças (PMDB-MG), barrado por causa de uma condenação por improbidade administrativa. Segundo o TSE, ele “aparenta ter votos para conquistar uma cadeira, mas tem que aguardar a redistribuição de vagas pelo quociente eleitoral”.
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